Que notícia realmente faria você comemorar o Dia do Meio Ambiente?
Perguntamos a alguns especialistas em meio ambiente quando teremos motivos concretos para celebrar o dia 5 de junho
O Dia do Meio Ambiente é polêmico. Não há certeza se o 5 de junho deve ser melhor celebrado ou lamentado, diante da quantidade de más notícias que competem com os avanços na área.
No Brasil, podemos comemorar o cadastro ambiental rural (CAR) que regulariza as propriedades, embora muitos tenham ficado de fora e o levantamento mostre a quantidade de florestas a recuperar. O ritmo de desmatamento da Amazônia continua desacelerando (embora parte disso seja culpa da crise econômica). Já o Cerrado desaparece longe dos nossos olhos (até Bonito está ameaçado). A Mata Atlântica continua minguando. A crise hídrica do Sudeste perdeu força com a volta das chuvas normais, mas não aprendemos nada em conservação de mananciais. Nem de limpeza dos corpos d’água. O Rio Doce levará décadas para se recuperar depois da lama da Samarco. O Rio de Janeiro receberá as Olimpíadas sem ter limpado a Baía de Guanabara. Teme-se intoxicação de atletas.
Abril e março bateram recordes de calor. O Brasil se comprometeu em Paris a reduzir as emissões responsáveis pelas mudanças climáticas, mas não está claro como o fará. Nos últimos anos, sujamos nossa matriz energética, trocando a produção limpa das hidrelétricas por maior contribuição das termelétricas que queimam combustíveis fósseis. Temos um enorme potencial para aproveitar a energia limpa, barata e confiável de novas hidrelétricas, mas não conseguimos transmitir segurança que as obras respeitarão populações e ambientes locais.
Nossas cidades pararam. Não só pelas manifestações, mas pelo excesso de veículos, fruto de uma política demagógica de incentivo fiscal para a indústria automobilística, desprezando o transporte coletivo mais eficiente. Agora que a bolha das montadoras estourou, fica o desemprego. Assim como estourou a bolha do pré-sal. Avançaram as iniciativas locais para expandir as ciclovias nas cidades, principalmente em São Paulo. O Rio de Janeiro vai inaugurar o primeiro veículo leve sobre trilhos (VLT) do país, que pode servir de inspiração para outras cidades.
Diante de um quadro tão complexo, fizemos a seguinte pergunta para algumas pessoas engajadas nas questões ambientais: “Que notícia faria você realmente comemorar o Dia do Meio Ambiente?”
Veja o que eles responderam.
Suzana Padua, presidente do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ): “A melhor notícia, digna de celebração, seria um Brasil com desmatamento zero, já tão anunciado, prometido mas não cumprindo, por tantos presidentes e tomadores de decisão. Bastaria que o brasileiro cumprisse as leis que protegem o percentual das matas em propriedades rurais nas margens de rios e encostas, ou manguezais e outros ecossistemas frágeis, que a conservação da biodiversidade e de todos os elementos da natureza ficariam assegurados. É muita riqueza que temos, e as perdas que continuam a ocorrer são injustificáveis nos dias atuais, quando é o conhecimento e não a extração de recursos naturais que pode ser a real fonte de riquezas. O Brasil precisa despertar para esse novo paradigma que valoriza o que existe em nosso país e que é capaz de trazer benefícios sociais, ambientais e econômicos. A natureza do país não pode ser comparada a de nenhum outro local do planeta. Por isso, devemos aprender a celebrar e valorizar essa maravilha chamada Brasil!”
Paulo Barreto, pesquisador sênior do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia:
“Presidente Temer priorizará a economia de baixo carbono. Ele convocou todos ministros para alinharem as políticas públicas com a redução das emissões que causam as mudanças climáticas. Isso envolverá por exemplo, exigir que os mais de R$ 200 bilhões de crédito rural sejam aplicados obrigatoriamente na agricultura de baixo carbono em no máximo cinco anos. Além de reduzir as emissões, as melhores práticas de agricultura melhorarão a conservação do solo, recuperarão e protegerão as florestas e a aumentarão a qualidade e quantidade de água. Na mesma linha, o governo vai coibir a sonegação do imposto territorial rural para desestimular o desmatamento especulativo que ocorre na Amazônia.”
Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima:
“Nós andamos tão carentes de boas notícias nesta área que uma só não me bastaria. Para compensar todas as más notícias dos últimos anos, para eu comemorar precisaria de três: um anúncio do governo de que o país terá desmatamento zero em todos os biomas na próxima década, um compromisso de descarbonização da matriz energética brasileira até no máximo 2050 e a destinação de 100% do crédito rural à agropecuária de baixa emissão de carbono. Estas são as condições mínimas para que o Brasil entre numa nova trajetória de desenvolvimento, em linha com os rumos que a economia mundial está começando a tomar e que trilhará durante este século. Como nenhuma mudança tão grande se faz sem forte apoio social e político, esses anúncios precisariam ser acompanhados da certeza de que os nossos piores representantes de vários partidos nunca mais se elegeriam para nada.”
Durval Libânio, presidente do Instituto Cabruca:
“No dia em que o Brasil entender que desenvolvimento e conservação podem caminhar juntos e decretar que todo sistema agrícola deve e pode ter árvores. Assim como no sistema Cabruca, que após 260 anos de cultivo de cacau, geração de riqueza e trabalho encontramos os maiores indivíduos de espécies nativas do bioma Mata Atlântica. Nele temos o maior Jequitibá do Brasil, localizado em uma Cabruca da fazenda Monte Florido em Camacã – Sul da Bahia.”
Márcio Astrini, coordenador de políticas públicas do Greenpeace:
“Várias notícias me fariam comemorar esse dia. A primeira delas seria ler que o Brasil ratificou o Acordo de Paris e, além disso, se comprometeu com o desmatamento zero. Outra notícia a ser comemorada seria saber que o Brasil vai respeitar os direitos indígenas e cancelar a obra da hidrelétrica de Tapajós”
Miguel Milano, engenheiro florestal
“Para comemorar o Dia do Meio Ambiente no Brasil? Aqui a situação anda tão ruim que só é preciso não piorar mais para a gente já comemorar. Nessa toada dois bons motivos de comoração seriam o formal posicionamento e empenho do novo governo contra a PEC 65 que desmonta o licenciamento ambiental no país e abre a porteira para muitas tragédias Marianas; e o STF acatar todas ou a maioria das ações de inconstitucionalidade contra artigos do novo código florestal estancando o enorme retrocesso imposto ao conjunto da nação pela minoria ruralista atrasada. Me desculpe o pleonasmo.”
Será que em algum Dia do Meio Ambiente comemoraremos uma dessas notícias?
Por: Alexandre Mansur
Fonte: Blog do Planeta/ Revista Época